Há dois meses, as oito famílias que vivem na Vila Nova do Amanã,
pequena localidade do município de Maraã, na região do Médio Solimões,
no Amazonas, passaram a ter acesso a um item básico para a maioria dos
brasileiros, mas considerado um luxo no local. A comunidade ribeirinha
recebeu três máquinas de gelo que funcionam com energia solar e estão
produzindo 90 quilos por dia.
"Essas famílias têm como principais atividades a pesca e a agricultura.
As máquinas vão atender à demanda de gelo, principalmente para
conservar polpa de frutas e pescado", diz Otacílio Soares Brito, do
setor de tecnologias sociais do Instituto Mamirauá, responsável pela
implantação do projeto Gelo Solar na região.
As fábricas de gelo são um pouco maiores que uma geladeira comum e
funcionam com um painel de energia solar. Cada máquina custa cerca de R$
25 mil e produz 30 quilos de gelo diariamente. A tecnologia foi
desenvolvida por pesquisadores da Universidade de São Paulo em parceria
com o Instituto Mamirauá, ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovação.
O projeto foi premiado no fim do ano passado pelo Desafio de Impacto
Social da empresa Google no Brasil. O prêmio, de R$ 500 mil, foi usado
para implantar três máquinas na Vila Nova do Amanã e uma na Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, instalada para que o Instituto
monitore na prática a eficiência do equipamento, que pode ser levado a
outras comunidades.
"O planejamento é acompanhar o funcionamento dessas quatro máquinas por
um período, cerca de dois anos, ao mesmo tempo em que estamos buscando
recursos para instalar máquinas em outras comunidades.", afirma Brito.
Ele ressalta que a tecnologia é inovadora por não precisar de baterias,
que poluem o meio ambiente e têm vida útil curta. "É a transformação de
energia elétrica em gelo." De acordo com Brito, a manutenção das
máquinas é simples - uma vez por mês é preciso passar um pano para
limpar os módulos e as máquinas de gelo -, e os aparelhos podem durar
até 25 anos. "A população está sendo capacitada para a gestão
comunitária da tecnologia. A ideia é que a gente acompanhe e ajude a
pensar a melhor forma de gestão dessa tecnologia.", acrescenta o
técnico.
Um dos objetivos do projeto é que as fábricas de gelo ajudem a aumentar
a renda das famílias. "Eles não vão consumir todo esse gelo, vai ter
uma sobra. Estamos conversando com a comunidade para dar um destino
adequado a esse gelo, enfim, encontrar uma forma estratégica para que
seja uma fonte de renda". Uma das ideias é vender o gelo extra para
comunidades próximas.
Brito lembra que a dificuldade para chegar à vila, que está a 100
quilômetros de Tefé e só tem acesso fluvial, faz com que as famílias não
tenham essas tecnologias comuns nas grandes cidades. "Assistem
televisão esporadicamente, quando o motor de luz funciona. Mas internet,
por exemplo, nem pensar.".
Para o especialista, iniciativas como o Gelo Solar podem ser uma saída
para a região amazônica, onde muitos ainda vivem na escuridão. "Acredito
que em curto prazo não vai chegar energia a alguns lugares da Amazônia.
A saída será a instalação de sistemas isolados, tanto para iluminação
quanto para gelo, bombeamento de água, etc".
Ele considera que as minitermelétricas, que vêm sendo implantadas na
região há mais de meio século, não resolveram o problema. "Não resolve o
problema da escuridão, porque o motor de luz, quando funciona, quando
não está pifado e tem diesel, o que é muito raro, funciona das 6h às
22h, quando é desligado. Não dá para funcionar geladeira, freezer, não
dá para conservar os alimentos", afirma.
Fonte: Uol
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