Mas a vila situada hoje no Paraná não tem gente. As casas, embora quase todas bem conservadas, vivem com as portas e as janelas cerradas.
Não tem padre para rezar missa nem bandido para ser encarcerado ali.
Só o cemitério, um dos únicos da região, está ativo.
Não se sabe ao certo quando o último morador do lugarejo –que chegou a ter 500 habitantes– deixou o local.
Sabe-se,
porém, que o êxodo teve início há mais de meio século, legando a
Ararapira, no município de Guaraqueçaba (PR), na divisa com SP, o
apelido de vila fantasma.
E é
justamente o mistério que envolve sua história que tem atraído
visitantes. Tamanha é a curiosidade sobre a vila que ela se tornou uma
das principais atrações de um passeio organizado pela Prefeitura de Ilha
Comprida (a 207 km da capital paulista).
Inaugurado
no início deste ano, o tour realizado no primeiro catamarã turístico do
Estado apenas parava em frente à vila, só acessível por barco. Mas as
pessoas começaram a pedir para conhecer o local de perto, segundo Rafael
Xavier, guia do passeio. As visitas foram incorporadas à programação.
"Tivemos
até duas senhoras que quiseram conhecer porque tinham nascido ali, mas
saíram crianças e tudo o que sabiam era o que ouviam de suas avós",
conta o guia.
No
último sábado (11), quem atracava no local era recebido por José Zózimo
Pereira Jr., 66. Advogado aposentado que fez carreira em São Paulo e que
hoje vive em Cananeia, ele nasceu em Ararapira, mas saiu de lá aos 11.
Uma
vez por mês, vai com a mulher, o gato e o cachorro à casa que pertencia à
sua família para aproveitar por alguns dias o sossego do local.
"Aqui
tinha cartório, posto fiscal, padaria, salão de cabeleireiro e clube.
Não tenho saudades porque saí criança, mas nunca deixei de vir nas
férias. E cada vez que eu vinha tinha menos gente. Só tem gente quando
tem festa."
NÃO TEM FANTASMA'
Todos
os anos, em 19 de março, as comunidades vizinhas e as pessoas que ainda
têm ligação com o local festejam ali o dia de são José, padroeiro da
vila (cujo nome oficial é São José do Ararapira).
O movimento também aumenta em novembro, às vésperas de Finados, quando o cemitério costuma ser limpo.
Há
alguns anos, os ex-moradores espalhados por São Paulo e Paraná decidiram
contratar um caseiro para cuidar do lugar. "Por isso, os turistas
encontram as coisas mais ou menos organizadas. Não tem nada de fantasma
aqui", afirma o advogado, que reclama da alcunha que considera
pejorativa.
Há
várias explicações para a debandada geral. Uma delas envolve uma disputa
entre Paraná e São Paulo, segundo José Carlos Muniz, historiador que
estudou a vila e conta que as primeiras habitações surgiram ali logo no
início da colonização do país.
Até a
década de 1920, Ararapira era paulista, mas virou território paranaense
por decreto. Cananeia (SP), que mantinha serviços básicos no local, como
os Correios, levou-os para a outra margem do rio, onde já era São
Paulo.
"O
governo paulista deu subsídios para quem quisesse continuar paulista.
Muitos saíram dali para fundar do lado a vila de Ariri. O Paraná ganhou o
local, mas o abandonou", afirma o historiador.
Outra
explicação está na erosão que começou a engolir o povoado nos anos 1950,
após abertura de canal artificial na área. Segundo José Zózimo, o que
resta é um vigésimo do que havia antes. "A erosão foi bem forte nos
últimos 30 anos. Se continuar, não existirá mais a igreja."
Fonte: Folha de São Paulo via Cidade News
Nenhum comentário:
Postar um comentário