Desta vez eu não tive que procurar um tema sobre o qual escrever, já que a repercussão do artigo SUBSTITUTOS DE REFEIÇÃO: A PROGRESSIVA CIENTIFICAÇÃO DE UMA PROPOSTA foi surpreendente e muitas pessoas me enviaram e-mails, solicitando-me que escrevesse mais sobre a minha experiência com estes produtos.
Em primeiro lugar é interessante comentar que os SUBSTITUTOS DE REFEIÇÃO se encaixam perfeitamente no contexto AMBIENTE OBESOGÊNICO. A revista Veja, em sua reportagem ESPECIAL: LONGEVIDADE, da edição de 15 de junho de 2011, descreve-nos que, se a jornada do ser humano tivesse ocorrido em um período correspondente ao dia de 24 horas, desde que ele surgiu há 1,8 milhão de anos atrás, o computador pessoal teria surgido às 23 horas, 59 minutos e 58 segundos, ou seja, bem nos seus segundinhos finais. Podemos fazer a correlação com o aumento da prevalência da obesidade no mundo, que passou a ocorrer mais ou menos no mesmo período, em decorrência da industrialização e urbanização crescentes, do aumento do sedentarismo, do ritmo de vida cada vez mais acelerado, enfim, todos estes fatores sobre os quais estou sempre escrevendo em meus artigos.
Mas é preciso deixar claro que os SUBSTITUTOS PARCIAIS DE REFEIÇÃO não são específicos para o tratamento da PERDA de peso, podendo ser usados também tanto para a MANUTENÇÃO como para o GANHO de peso, dependendo do estado nutricional do paciente.
REDUÇÃO DO PESO
Para o tratamento de perda de peso, muitas vezes utilizamos os substitutos de refeição 2 vezes por dia. Em geral, eles substituem 2 refeições principais, como o café da manhã e jantar, mantendo-se a referência de uma refeição "normal", neste caso o almoço. Naturalmente, orientamos para que o paciente mantenha escolhas alimentares adequadas, qualitativa e quantitativamente, ou seja, escolhas que se encaixam dentro da proposta dietoterápica. Ele tem ainda "direito" a 3 lanches ao longo do dia, nutrologicamente corretos.
Mas existem situações em que fazemos modificações desta proposta usual (substituição do café da manhã e jantar) por um outra que se enquadra melhor no dia do paciente. Por exemplo: uma pessoa que tem dificuldade em fazer um lanche saudável no meio da tarde, muitas vezes se "esgota" de tal forma com as horas prolongadas sem ingestão de alimentos que chega em casa absolutamente exaurida de todas as suas reservas, o que se manifesta geralmente com algum grau de "ansiedade". Um "shake" no meio da tarde pode ser uma excelente opção para este paciente, deixando-lhe mais saciado, mais equilibrado, de modo que consiga compor a sua refeição noturna, mantendo escolhas adequadas.
Por outro lado, a substituição apenas do jantar por um "shake" pode ser uma estratégia que reduz a ingestão total de calorias em quantidade suficiente para sustentar uma perda de peso satisfatória. Hoje em dia, realmente, o ritmo de vida sobrecarrega as pessoas de tal forma que elas tendem a se excederem na ingestão noturna de alimentos por um mecanismo facilmente compreensível de "compensação". Limitar a ingestão de calorias com um substituto de refeição pode ser "tudo" de que esta pessoa precisa para se equilibrar e, inclusive, acaba sendo uma preocupação a menos, já que sua escolha alimentar é definida com antecipação. Os "disk-qualquer coisa" e lanches hipercalóricos, com certeza, passarão a ser opções esporádicas.
MANUTENÇÃO DO PESO
Aqui poderia dar inúmeros exemplos em que o "RECURSO SHAKE" pode ser tudo de bom!
Você está viajando a lazer ou a trabalho e, chegando tarde, cansado no hotel, não tem nada à disposição para preparar uma refeição nutricionalmente saudável, encontrando opções imediatas muito calóricas no restaurante ou imediações do próprio hotel, ou através dos serviços disponíveis de tele-entrega: não cairia bem um "shake"?
Você está trabalhando e, envolvido com os atrasos cotidianos, se vê sem tempo de fazer uma refeição adequada, até mesmo o almoço que, de início, deveria ser "sagrado": não cairia bem um "shake"?
Você saiu de casa para resolver várias coisas na rua, a fome está começando a sinalizar, mas parar para fazer uma refeição adequada pode significar pegar um baita engarrafamento de veículos na hora do "rush": não cairia bem um "shake", de fácil preparo?
Você perdeu o peso que desejava e agora está na fase de manter o peso, usando o "shake" 1 vez por dia, mas se excedeu no jantar de final de semana e precisa de algum mecanismo de compensação: não cairia bem um "shake a mais", neste caso, reduzindo objetivamente a ingestão de calorias no(s) dia(s) seguinte(s) ao abuso de ingestão alimentar?
Se eu me estender demais, dando os inúmeros exemplos de "consultório", corremos o risco de você não acabar de ler o artigo (quem sabe por falta de tempo!) e, portanto, vou passar para o tópico GANHO DE PESO, deixando claro que o assunto está longe de ser esgotado.
GANHO DE PESO
Neste caso, além das suas refeições usuais, você pode acrescentar o "shake" para aumentar a sua ingestão calórica, além de ser rico em nutrientes, o que pode ter um papel muito importante para se atingir as necessidades diárias recomendadas. Na minha experiência, esta é uma opção muito importante para pacientes idosos, que tendem a se descuidar com a ingestão de alimentos por uma série de circunstâncias próprias da idade. A sistematização do uso do "shake", entendido aqui como um suplemento nutricional, pode ajudar a "compensar" a tendência à perda de peso e de massa magra deste grupo de pacientes.
INDIVUALIZAÇÃO DO TRATAMENTO
Embora tudo pareça muito simples, ainda temos uma série de questões a serem investigadas para o uso adequado dos produtos:
O paciente tem níveis adequados de vitamina D, reconhecidos através da dosagem da 25-OH-vitamina D sérica? Isto porque, sem a vitamina D, ele pode até estar ingerindo quantidades adequadas de cálcio, mas não estará absorvendo-o adequadamente. Esta relação entre ingestão e absorção/aproveitamento pelo organismo se estende a todos os nutrientes ingeridos através da dieta.
O paciente atinge a quantidade diária recomendada de proteínas? Esta necessidade é calculada de acordo com o peso do paciente e seu grau/tipo de atividade física, mantendo-se ainda a preocupação do "valor biológico da proteína ofertada", isto é, deve ser uma proteína de boa qualidade para a adequada reposição dos aminoácidos, seus constituintes básicos, necessários para a realização de diferentes funções orgânicas.
O produto específico em uso pelo paciente atende as IDRs (Ingestão Diária Recomendada) dos nutrientes? É importante conhecermos bem o produto utilizado para que possamos orientar adequadamente a ingestão de alimentos ou suplementos que complementem as necessidades individuais, além do uso do "shake". Atenção especial deve ser dada aos ácidos graxos ômega-3 que usualmente não são repostos adequadamente. Lembramos que os peixes de águas frias e profundas (anchova, linguado, bacalhau, truta, arenque, cavala, atum e sardinha) são excelentes fontes destes tipos de ácidos graxos essenciais, devendo ser ingeridos, sempre que possível, pelo menos 2 vezes por semana.
Concluindo:
O uso de substitutos de refeição, particularmente os líquidos, conhecidos como "shakes", tem se mostrado uma opção prática e versátil, segura e eficaz, reconhecida cientificamente, que se encaixa em inúmeras situações cotidianas para se manter ou atingir um peso adequado.
Devemos, no entanto, estar atentos a manter uma boa oferta diária de frutas, hortaliças, cereais integrais, sementes oleaginosas, azeite de oliva extravirgem, entre outros alimentos saudáveis recomendados para redução de risco de doenças crônicas não-transmissíveis, as quais figuram entre as principais causas de morte no mundo nos dias de hoje, como a própria obesidade, as doenças cardiovasculares, o diabetes mellitus e vários tipos de câncer. Estes alimentos certamente se encaixam nas outras refeições e lanches, podendo ainda serem utilizados combinados com os "shakes" (que podem ser preparados com ameixa preta, banana, mamão, morango, aveia, quinua, entre outros alimentos indicados, dependendo do estado nutricional e quadro clínico de cada paciente).
Em qualquer situação, a orientação especializada é não somente interessante, mas essencial para o adequado acompanhamento do estado nutricional através dos dados de anamnese, exame físico, dosagens laboratoriais e demais exames complementares, solicitados pelo médico.
Este tende a ser um assunto polêmico. Sempre nos depararemos com pessoas defendendo que um adequado planejamento alimentar exclui a necessidade de utilização de SUBSTITUTOS DE REFEIÇÃO para composição da nossa dieta usual. Concordo plenamente. Só que estamos diante de uma realidade em que, mesmo com todo o conhecimento científico adquirido nas últimas décadas sobre saúde, longevidade, estilo de vida, nutrição celular e tudo mais, deparamo-nos com o aumento assustador das doenças crônicas não-transmissíveis. Portanto, devemos nos posicionar com uma visão abrangente que entende a necessidade do ser humano de ir sempre buscando soluções para as dificuldades que surgem ao longo do caminho. Proponho que, desta forma, este assunto seja trazido para discussão em se considerando o exercício da Nutrologia, em benefício de um número cada vez maior de pacientes que necessitam de estratégias para vencer o ambiente obesogênico ao qual estamos expostos e aqueles que almejam garantir uma oferta adequada de nutrientes através do uso sistemático de um alimento desenvolvido para fins específicos.
Enviado em 13 de janeiro de 2012 por:
Dra. Isabela M. B. David
Diretora de Atividade Científica da ABRAN
Editora do site www.abran.org.br
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